10 dezembro, 2007

Vazio existencial

Alguma coisa me dizia para ir ao site da RTP2. As previsões confirmaram-se. A minha vida deixou de fazer sentido. Pior que o Inverno, só coisas más a acontecer no Inverno. Depois de segundas-feiras a fio mantendo-me incólume, às 22h45, em frente à televisão, perdi o último episódio d' "Os Sopranos". Hoje já não dá. E nasce em mim um vazio existencial semelhante ao do dia em que Christopher Moltisanti foi assassinado ou quando tive bilhete reservado para os Animal Collective num cacilheiro e não fui. Com que cara olho agora para a minha Sony? Qual o lugar dela na minha sala? Um cataclismo destes só pode ser ultrapassado por o quê? Uma integral do Scorcese na Cinemateca? O novo filme do Coppola? O Twin Peaks em substituição do "A Ganhar é que a Gente se Entende" na SIC?

08 novembro, 2007

Empurrado por um vento idiota

Parto de coração vazio. Esta terra é pequena demais para se viver desta forma. A ficar, definhava certamente até não haver uma réstia de pensamento ou amor próprio dentro de mim. A partir, teria que ser definitivamente, com o compromisso de esmagar qualquer memória ou recordação que teimasse em acompanhar-me. De outra forma nunca conseguria existir.
É assim que chego à Cidade, sem qualquer contacto, referência ou prioridade.
Os primeiros tempos são de clausura quase total. Lentamente, como um animal recém-nascido, vou alargando o campo em que me movo. Todos os dias arrisco mais um pouco, dou mais uns passos, o mundo novo que tenho diante dos meus olhos obriga-me a penetrá-lo.
Além dos livros, chega o contacto com a música e o cinema. Eis Dylan. Bob que podia ser Thomas, Dylan por causa de Thomas. Lá, agora, sempre, Dylan. Blood on the Tracks faz a descrição do eu que trazia comigo. Dylan descreve tudo o que sinto de uma forma para mim inatingível ou sequer pensada. Dylan explica-me a existência desse vento idiota que nos empurra sem rumo ou destino, que nos despe de discernimento ou vontade e nos deixa apenas a vaguear inconscientemente por um mundo que não queremos nosso, mas que é o único que temos.

(…)
I can't feel you anymore, I can't even touch the books you've read
Every time I crawl past your door, I been wishing I was somebody else instead.
Down the highway, down the tracks, down the road to ecstasy,
I followed you beneath the stars, hounded by your memory
And all your raging glory.

I been double-crossed now for the very last time and now I'm finally free,
I kissed goodbye the howling beast on the borderline which separated you from me.
You'll never know the hurt I suffered nor the pain I rise above,
And I'll never know the same about you, your holiness or your kind of love,
And it makes me feel so sorry.

Idiot wind, blowing through the buttons of our coats,
Blowing through the letters that we wrote.
Idiot wind, blowing through the dust upon our shelves,
We're idiots, babe.
It's a wonder we can even feed ourselves
[1].

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[1]Letra de Idiot Wind, uma das músicas do álbum Blood On the Tracks de Bob Dylan, publicado em 1976


"Tarântula", única obra de ficção de Bob Dylan escrito em 1966, chegou ontem às livrarias.

23 outubro, 2007

Cinema: a crítica

Os críticos escrevem sobre cinema ou substituindo os nomes do realizador e dos actores poderia ser sobre uma peça de teatro ou um livro? A resposta aqui.

12 outubro, 2007

O congresso do PSD

A meio da década de 90, ainda como director do Independente, Paulo Portas assinou um editorial sobre o congresso do PSD que se pautava por uma coluna a um terço da página com o título "O Congresso do PSD", sem nada escrito a não ser no fundo da página uma linha com o seguinte: "Isto são as ideias discutidas no congresso do PSD". Agora, mais de dez anos depois, é possível dizer-se o mesmo. A única novidade será Santana Lopes como líder parlamentar. No entanto, pode ser que se saiba no que é que consiste o acordo que os dois fecharam ao jantar num hotel. Eu aposto que é o caminho para meter Santana outra vez como primeiro. Resta saber é como.

PS: E a lista de ausências? Vai ofuscar a lista de presenças?

08 outubro, 2007

Um PCP maior

Demorei tempo, mas percebi. Aquilo que Jerónimo de Sousa queria dizer com "teria a maioria absoluta se os protestos fossem só de comunistas" significa que admite que o seu partido é pequeno demais para fazer frente ao governo e que gostava de ter mais apoio, da parte de outros "democratas" como ele.
A estratégia utilizada para fazer oposição agora, não é muito diferente da utilizada proverbialmente pelo PCP. Deixar o governo falar, para depois se pôr do contra. Revela a origem baixa do partido e uma forma de argumentação utilizada por quem não tem argumentos. Basta ver as suas propostas, que nunca passaram da luta pelos direitos dos trabalhadores e por uma socieadade justa. Bem dito, mas acho que os outros partidos também pretendem o mesmo. Ninguém actua de má-fé. Daí a diabolização dos "do lado de lá", como dizia a Simone e o Carlos do Carmo, referindo-se ao palco/plateia. Daí também a separação entre os que têm sempre razão, porque são coerentes, e os que não têm nunca razão porque andam ao sabor do capital e das exigências impostas pela sociedade capitalista.
No entanto, esta forma de oposição já não se faz só no Parlamento. Ela é móvel, persegue os eventos da agenda do governo e pretende afirmar-se sempre que o governo se quer afirmar. O ministro abre uma ponte, o PCP (ou um dos seus satélites) está lá para dizer que a ponte não devia ter sido feita ali. Mais, envia um professor ou um enfermeiro para entregar uma prenda, que pode ser um dossier de propostas ou uma lista de despedidos, ao ministro. Tudo em directo, tal como o governo quis mostrar. Trata-se de uma oposição parasita, que exige poucos meios e funciona bem. É uma operação cirurgicamente planeada, onde tudo tem que funcionar a horas e sem falhas. Faz lembrar outros tempos e outros modos de actuar que nem devo referir. É por isso que José Sócrates tem razão quando chama a atenção para a diferença entre o direito à manifestação e o direito ao insulto. Bem sei que dizer, hoje em dia, que Sócrates acertou uma é estar incondicionalmente do lado dele. Os direitos estão confundidos. O despespero da oposição de esquerda é total. A direita nem existe. Por isso têm que ser todos contra um. Faz lembrar os últimos anos de Cavaco. Por isso é que Jerónimo de Sousa acredita que a manif de dia 18 será "a maior acção", reparem na linguagem, "das últimas décadas". Mas quem é que o segue? Quem vai lutar, "na primeira linha de combate", em nome do Serviço Nacional de Saúde, da escola pública, dos direitos justos dos professores, dos trabalhadores com salários em atraso ou ameaçados de despedimento, dos pequenos agricultores e empresários? Menezes? Nem ele.

27 setembro, 2007

Santana Lopes, um homem a seguir

Pior do que concordar com as ideias de Santana Lopes é concordar com as suas atitudes. É a primeira vez, mas tenho que me pôr do lado do ex-primeiro-ministro (não me esqueço...).
A sua saída durante o Jornal das Nove da SIC foi totalmente justificado. Por motivos que de certeza pertencem ao domínio do transcendental, vi mais uma vez este espectáculo em directo, depois de ter assistido ao Verde Eufémia. Mais incompreensível (longe do racional) ainda, é a segunda vez que vejo isto no Jornal das Nove, sempre com a Ana Lourenço aos comandos da emissão. Foi durante um debate entre a Ana Drago e um economista do PSD, do qual não me lembro o nome, em que este também disse que não participava mais no debate, perante a impertinência da miúda do Bloco de Esquerda, embora não abandonasse o estúdio.
Santana Lopes detém o título de enfant terrible da política e Ana Lourenço não é com certeza o correspondente no jornalismo televisivo. Mas, um engraçadinho que está por detrás dos bastidores e que dá pelo nome de Ricardo Costa, já o pode ser. Basta ler a sua coluna no Diário Económico ou as moderações do Expresso da Meia-Noite para ver como se rói por não poder desmascarar tudo o que sabe. Foi ele que naturalmente e enquanto director de programação veio em defesa da SIC, dizendo que a reacção de Santana Lopes foi "desproporcionada". Pondo o ex-primeiro-ministro (é preciso sempre lembrá-lo...) ao mesmo nível de um treinador de futebol mostrou que a sua atitude foi mais a de humilhar Santana do que defender a estação de televisão. Mas não chegou. Da forma como um comentador da notícia do Público pôs a questão: "Afinal o Mourinho chegou a Portugal, para ir para casa dormir. Noticia sensacional e com muito interesse. Bem feito. Pedro Santana Lopes soube dar a resposta."
Mais interessante ainda é ver a troca de personalidades aqui, tipo "Face-off". Santana, que foi dirigente desportivo, interroga-se, à jornalista e aos espectadores, sobre se o mundo do futebol passa por cima das directas do segundo maior partido político do país. "Acha que a chegada de um treinador de futebol é mais importante que as directas de um partido?", perguntou. A SIC, esse agora pseudo-baluarte do jornalismo de referência, não tem dúvidas. Sim, o futebol é mais importante que a política. Em defesa da SIC, devo dizer que se o futebol e a política andaram sempre de mãos dadas e sujas, como dois irmãos depois do recreio, torna-se difícil ter critérios. E quando Pacheco Pereira vem dizer que Santana Lopes teve razão nalguma coisa, é porque o mundo está quase a acabar. Com programas de informação assim, que é que precisa dos Sopranos à 00h30 ou o House quase à uma?

14 setembro, 2007

Piparote de menina

Não quero que interpretem nas minhas palavras qualquer sinal de xenofobia, mas é por estas e por outras que sou contra a participação de estrangeiros, de gema ou nacionalizados à pressão, na selecção nacional. Tinha que vir um outsider qualquer manchar o bom nome de Portugal e dos Portugueses. A perder a cabeça não era de dar um soco como deve ser?
Reparem:











Não é preciso explicar pois não?

Se é, reparem nas diferenças:














Por um lado, Scolari num aparato gay, por outro, João Pinto qual guerreiro Celta caminhando sem medo contra a lança do inimigo. Isto sim, é um soco bem aviado.

Quando queremos brincar, o que o Scolari fez ou é coisa de maricas ou de miúdo, fazemos como o puto dos sub-21 que, mostrando o elevado sentido de humor que nos caracteriza, tirou o cartão da mão do árbitro numa alegre brincadeira.

Como se já não tivesse feito asneira suficiente, Scolari além de não admitir que não sabe dar um murro como deve ser, arranja uma desculpa mais esfarrapada que um jovem do Intendente que não muda de roupa há 3 anos: `fui defendê o minino”. Azar dos azares, o “minino” era Quaresma, que dá mais sarrafada num jogo que os Neo-Zelandeses do râguebi numa época inteira. Aliás, vê-se claramente que o rapaz está cheio de medo a brincar com a bola.
O que Scolari fez é indesculpável, depois do piparote à menina inventa uma desculpa que não cabe na cabeça de ninguém.

A única coisa que pode abonar um pouco a favor do Piparolari (e não Socolari como vi para aí escrito), é que assim ninguem falou de futebol. O que, convenhamos, por estes dias dá muito jeito à selecção.
Para terminar quero dizer que não sou como aqueles radicais que querem já a demissão do seleccionador, contudo acho que é urgente que lhe dêem formação num ringue de boxe.

03 setembro, 2007

Gualter Baptista Movimento Verde Eufémia Milho Transgénico Entrevista Mário Crespo

À IP

Prémio Denominação pomposa para acto de vandalismo:
"Uma acção política de carácter inédito"

Prémio O que é que eu tenho a ver com este assunto:
"Estava a falar com a imprensa durante o ataque"

Prémio Colecção Outono/Inverno:
"Taparam a cara por razões estéticas"

Prémio Um dia vais perceber o que é:
"A legitimidade é um processo complexo"

Prémio Pinto da Costa&Família Loureiro:
"Não sei se existe pontapé ou um levantar do pé"

Prémio Pare por favor que já me dói a barriga de tanto rir:
"Esta acção é comparável com o que faz a ASAE"

Prémio Já houve uma criança de 5 anos que caiu nesta:
"Eu não estava nessa acção estava só a dar voz a essa acção"

31 agosto, 2007

Mário Crespo vs Gualter Baptista

Na senda dos vídeos neste blog, um já clássico da televisão portuguesa: Mário Crespo entrevista Gualter Baptista, do Movimento Verde Eufémia, e fica de tal modo entusiasmado que se ri do entrevistado e pede mais tempo à regie para continuar uma entrevista delirante. Isto é mesmo um momento histórico. São 36 minutos do melhor, com Gualter Baptista a tentar justificar a acção, a fugir à responsabilidade como mentor, a tentar explicar como o movimento foi automaticamente criado naquele momento, como se encontraram todas as pessoas ali, quem tinha pago o autocarro para levar os freaks à passeata, etc...

http://eufemia.ecobytes.net/2007/08/27/mario-crespo/

29 agosto, 2007

Dinamarca: um passo à frente

Como Cumprir os Limites

23 agosto, 2007

Foi assim

Uma curta pesquisa permite ver que um livro como “Foi Assim”, de Zita Seabra, faz falta para levantar fervura no debate sobre um período da história feito de mitos e depoimentos orais, encerrado em muitas contradições, desmentidos, com uma posição do PCP que não ata nem desata e então, para quem não teve o prazer de acompanhar os cinco anos de 75 a 80, fica apenas um limbo interessantíssimo de seguir. “Comunistas ferrenhos”, como se dizia então, acusam Zita Seabra de ser uma traidora e uma pessoa sem carácter, uma categoria onde caem todos os que mudam de opinião, principalmente quando esta nasce a partir da constatação de contradições que o partido encerra. Pessoas de outros quadrantes políticos, à esquerda e à direita, também dizem que Zita Seabra é uma pessoa a abater moralmente, porque entra num partido de direita (PSD) por puro oportunismo e aceitam o fim da sua relação com o PCP como se o problema fosse ela e não o partido. Recordo-me vagamente de quando isto aconteceu e de não ouvir uma única pessoa a tentar compreender. Até hoje, as dissidências dos militantes em época democrática foram sempre pouco faladas e muito poucas vezes aproveitadas por outros partidos. A história de Zita Seabra é interessante do princípio ao fim porque mostra que pessoas muito inteligentes entravam para o partido da acção não cegamente mas conscientes de que aquela era a melhor solução para o país e para o mundo. E mostra, nas primeiras 50 páginas que eu li, uma organização extrema, quase semelhante a um formigueiro de ideias e comportamentos que funcionava como um relógio para chegar aos seu fim. Mas, sobretudo, de como a ideologia comunista conseguia que as pessoas se tornassem instrumentos ao serviço de uma organização, deixando tudo para trás: família, filhos, mulheres, fortunas, amigos.

21 agosto, 2007

O vale era verde, Eufémia

Agosto esquisito, sol num dia, chuva nos 3 seguintes e a praia onde não se pode estar. Um Agosto destes deixa algumas pessoas sem saber o que fazer: e que tal vandalizar uma propriedade privada aproveitando a companhia das câmaras de televisão e da GNR? Boa! Bora lá!

Gualter Baptista, porta voz do Movimento Verde Eufémia (com toda a certeza que o nome foi escolhido pelo próprio), é provavelmente o maior anormal a ter tempo de antena na comunicação social dos últimos tempos.
Segundo tal personagem, uma espécie de cruzamento entre Pinto da Costa, Valentim Loureiro e o Sapo Cocas, o objectivo de tal acção era, e passo a citar com um prazer que nem imaginam, “restabelecer a ordem ecológica, moral e democrática através de uma acção de desobediência civil, uma das formas de manifestação numa sociedade civil democraticamente evoluída”. Prosseguindo com uma eloquência verbal capaz de fazer inveja a toda a gente, dispara: "estudos independentes revelaram alterações das funções hepáticas e renais (provocadas pelo consumo de alimentos transgénicos)”, para mais à frente lamentar "a falta de estudos independentes nesta área uma vez que há efeitos na saúde pública que estão ainda por conhecer a fundo". Perceberam? Eu também, o gajo é jogador de futebol e está de férias.
Para terminar remata com um “não pensem que se trata de um bando de vândalos sem ideias e que não tinham mais nada para fazer”. Claro que não, é preciso estar de muito má fé para pensar uma coisa dessas.
Urgente, arranjem uma Câmara Municipal para este senhor.

31 julho, 2007

Bergman, Antonioni, Serraut

Ingmar Bergman morreu ontem. Os primeiros meios a dar a notícia foram os jornais online. Numa questão de minutos, conseguiram depoimentos de alguns cineastas e cinéfilos portugueses, tendo mesmo um deles ficado surpreendido por ainda não saber da notícia. Mas logo se pronunciaram sobre o “lendário” realizador sueco como “para lá da história do cinema” (Joaquim Sapinho), responsável por “uma relação sensualista entre as personagens e o mundo” (Joaquim Sapinho), um homem que “compreendeu o cinema como uma companhia de teatro” (Jorge Silva Melo), este último caso não abonando muito a seu favor. À noite, todas as televisões falaram deste fatal desaparecimento. Jornais insuspeitos nestas andanças, como o Destak, sublinharam o fim de Bergman. Quantas pessoas terão visto um filme dele? Quantas terão gostado? Deixando isto para trás: o que nenhum dos habituais comentadores estava à espera era que, horas mais tarde, outro realizador “lendário”, Michelangelo Antonioni, iria também morrer. Dessa forma, a morte do segundo terá sido abafada pela morte do primeiro. Quem se iria pronunciar pela morte do segundo depois de se ter pronunciado sobre o primeiro como o maior de sempre? E Antonioni, seria um realizador de segunda, com o “Blow Up” e o “Profissão: Reportér”? São estes os problemas de endeusar algumas figuras. Imaginemos que Manoel de Oliveira também morria. Dada a prioridade por causa de ser português, já estou a ver os títulos. “Europa fica sem cineastas. Oliveira era o maior, mas Bergman e Antonioni não eram maus”. Os comentadores ficam baralhados, sem saber o que dizer. Não será melhor fazer pré-obituários? Afinal, quem ficará surpreendido por uma pessoa com a idade deles morrer? E Michel Serraut, um “lendário” actor francês que morreu entre Bergman e Antonioni? Quem falou dele?

06 julho, 2007

The Simpsons

“A family can sit down and watch it, but a snarky writer from the Observer respects it, and so does someone who's wearing a dirty cat cap and driving a truck across the plains”. Isto é Conan O’Brien, do Late Night Show, a falar do que melhor tem The Simpsons, onde foi argumentista. Pode ser encontrado na Vanity Fair de Agosto.

29 junho, 2007

Tourada

No Pastoral Portuguesa:

"De volta à festa na RTP, um grupo de adolescentes descritos como sendo «forcados amadores de Alcochete» prepararam uma manobra no sentido de evitar que um touro com um ar muito pouco festivo se deslocasse do ponto A ao ponto C. Para este efeito, um dos adolescentes colocou-se no ponto B, tendo ainda o cuidado de informar a audiència sobre a espécie de animal que ali se encontrava para participar na festa: "É touro! É touro! É touro!"
O plano, contudo, foi evidentemente mal ensaiado. O touro, talvez com o pensamento ocupado por chapéus coloridos, línguas-da-sogra, e outros artigos festivos, insistiu em deslocar-se até uma determinada secção da arena, situada precisamente atrás do grupo de adolescentes. O primeiro adolescente tentou abraçar o touro. O segundo adolescente tentou abraçar o primeiro adolescente. O terceiro, quarto e quinto adolescentes tentaram abraçar-se a si próprios, enquanto o touro se esquivava a todas as manifestações de camaradagem, mostrando uma indiferença pelo clima próprio das festas que foi descrita pelo comentador da RTP nestes termos: "o touro a mostrar ali alguma maldade"."

17 junho, 2007

Richard Rorty (1931-2007)

Richard Rorty, filósofo, morre aos 75 anos.
É com esta frase seca que começam os obituários dos jornais norte-americanos e um obituário é uma das formas mais justas de homenagear Rorty. Uma forma de narrativa inexistente na Europa judaico-cristã: porquê celebrizar a vida no momento em que ainda se está de luto?
Rorty ficou conhecido por ter sido um relativista, um filósofo de pouco rigor, um inconsequente. Na América de esquerda, democrata, foi visto com desconfiança porque a defesa do pragmatismo de Dewey e James era demasiado liberal; a esquerda Europeia olhou-o de lado por razões semelhantes: Rorty meteu num saco Kant e sua ideia de paz perpétua mais a trilogia ideológica do Iluminismo "Liberté, Egalité, Fraternité" e esmagou-os com um murro. A direita norte-americana detestou-o quando abandonou a tradição analítica e embarcou pela filosofia da linguagem do Linguistic Turn e pelo misticismo de Wittgenstein. A direita europeia nunca o podia compreender: ele era um acérrimo defensor de todos os pensadores político-sociais da esperança utópica: Platão, o Hegel da Fenomenologia do Espírito, Marx, Trotsky e os pós-modernistas franceses, com Derrida e Foulcault à cabeça.
Rorty era um filósofo de concensos e talvez por isso não tenha conseguido nenhum. Explicando melhor, o ponto de partida do pragamatismo leva-o a pensar que nada é definitivo. Nada tem valor absoluto, nem sequer a História. E se a história da Filosofia não tinha chegado, ao fim de mais de dois mil anos, a nenhuma conclusão sobre aquilo a que se propunha, era porque os pontos de partida de cada um dos filósofos eram diferentes (circunstanciais) motivando todas as decisões intelectuais a partir daí. Qual a conclusão? A filosofia não dá respostas. Resolve problemas. Posta como tinha sido até à publicação de "De la gramatologie" e "Écriture et différance", de Derrida, a história das ideias tinha sido apenas uma discussão de termos, ou vocábulos, uma taxonomia de sentidos, como Wittgenstein já tinha sugerido. Mas Derrida é um filósofo impenetrável e Rorty é tão claro que foi acusado de estar mais próxima da literatura do que da filosofia.
Em "Contingência, Ironia e Solidariedade" põe os pontos nos is e assume a influência da literatura nas suas ideias. Procurando saber como é que o homem pode ser capaz de lidar com ideias contraditórias, que não cabem nos cânones éticos e psicológicos baseados na sucessão lógica, Rorty avança com a ideia do ironista liberal, como Nabokov. O ironista liberal será o homem que é capaz de determinar as suas acções em sentidos diametricalmente opostos sem se contradizer e conseguindo sempre um sentido para o que faz. Como? O ironista liberal é um homem da palavra. Não é um pregador (que foi a primeira coisa em que pensou, conforme conta nesta auto-biografia), mas antes uma pessoa capaz de discutir assuntos, aceitar ideias, mas também convencer. A ideia de solidariedade é mesmo essa: a de um mundo em conversação, constantemente a definir planos de melhoria das condições dos povos mais desprotegidos, sem o apoio de quadros de referência como a carta dos direitos humanos da ONU. No fundo, uma aceitação de parte a parte, com vista a objectivos específicos.
Rorty nunca será estudado nas escolas. As suas ideias e a sua forma de argumentar são demasiado radicais, reconciliadoras e sinceras para que sejam levadas a sério. Ainda para mais, em Portugal, um dos seus maiores discípulos é Manuel Maria Carrilho.

04 maio, 2007

O Captain, my captain!

"Não serei o primeiro a abandonar o barco". A propósito desta frase de Carmona Rodrigues, um poema de Walt Whitman:

(imaginem um vereador do PSD no papel de narrador, substituam "ship" por "CML", "the people all exulting" por "the people all exausting" e reparem como se adequa bem à situação)

O CAPTAIN! my Captain! our fearful trip is done;
The ship has weather’d every rack, the prize we sought is won;
The port is near, the bells I hear, the people all exulting,
While follow eyes the steady keel, the vessel grim and daring:
But O heart! heart! heart! 5
O the bleeding drops of red,
Where on the deck my Captain lies,
Fallen cold and dead.

2

O Captain! my Captain! rise up and hear the bells;
Rise up—for you the flag is flung—for you the bugle trills; 10
For you bouquets and ribbon’d wreaths—for you the shores a-crowding;
For you they call, the swaying mass, their eager faces turning;
Here Captain! dear father!
This arm beneath your head;
It is some dream that on the deck, 15
You’ve fallen cold and dead.

3

My Captain does not answer, his lips are pale and still;
My father does not feel my arm, he has no pulse nor will;
The ship is anchor’d safe and sound, its voyage closed and done;
From fearful trip, the victor ship, comes in with object won; 20
Exult, O shores, and ring, O bells!
But I, with mournful tread,
Walk the deck my Captain lies,
Fallen cold and dead.














O jardim de JJ

Comecei a ganhar algum respeito por JJ ao mesmo tempo que fiquei farto das verborreias que sobre ele se dizem, mais a utilização das suas acções políticas (e não só) como abertura de telejornais e artigos de opinião. Até na própria figura de JJ há hoje um simbolismo que representa tudo aquilo que é mau na política. Um homem fisicamente semelhante a um porco, que engordou à custa do povo madeirense e o exibe através das fumaças soltas por um charuto.

Mas JJ é mais um símbolo daquilo a que a que as sociedades modernas podem chegar. Repare-se: a Madeira tinha todas as condições para ser um paraíso na terra, como já o foi nos anos 50/60. Uma espécie de Hawai para o país. Mas com a eleição deste senhor, juntamente com um desinvestimento na formação da população, o esquecimento territorial por parte do cont'nente , e a proliferação impune de políticas que só são possíveis porque a Madeira tem governo próprio (não esquecer), as coisas estão na situação em que estão: JJ com sessenta e tal por cento de intenções de voto e o principal partido da oposição com 16 ou o que é e a dizer que não é possível fazer oposição a JJ. O que é curioso é que JJ é eleito pela população madeirense. Nem nos devíamos rir disso, porque já tivemos o Santana Lopes como primeiro-ministro.

Por outro lado, JJ é enervante para a classe política porque faz o que todos os outros não são capazes. Utiliza a arma que tem ao dispor, o poder democrático, e atinge a república como esta fosse um animal inocente. Ainda por cima é uma pessoa que conhece muito bem a constituição e nunca dá passos em falso. Há alguma coisa que tenha dito ou feito que não seja legal? Se não o é porque não há investigações parlamentares e judiciais sobre isso? Não é JJ que é o palhaço do cont’nente, é o cont’nete que é um bonequinho de JJ, porque o é permitido. Houvesse outros políticos com a coragem de JJ e se calhar estas diatribes não lhe eram permitidas. Diriam: “Mas isso não era um estado democrático”. E este, é?

03 maio, 2007

JJ no seu jardim

Juntamente com a demissão (pormenor meramente formal) por não concordar com as restrições orçamentais impostas pelo “Governo de Lisboa”, João Jardim (JJ) continua em jeito de na minha casa mando eu. Faz dezenas de inaugurações e gasta 4 vezes mais do que nas últimas eleições em que foi candidato (2004). Ou seja, faz de Sócrates um parvo, faz de Cavaco um parvo e só não faz da maioria dos Madeirenses uns parvos, porque estes há décadas que já o são.

JJ descerra placas e/ou corta fitas em tudo o que lhe aparece pela frente. Público ou privado pouco importa, são já domínios pouco distinguíveis em terras de sua majestade (a ilha e o rei são outros). A Madeira é um jardim, a Madeira é do Jardim.

Vias públicas, obras privadas, lojas comerciais, hotéis que já estão em funcionamento, prédios que estão por concluir, tudo, mas mesmo tudo, é dele.
Como quem não deve não teme, acresce a pompa e circunstância necessárias, bem como a ampla e mediática cobertura pelos seus orgãos oficiais de campanha – RTP-M, RDP-M e Diário de Notícias da Madeira. Por fim, para que de dúvidas nem uma réstia, desloca-se em campanha partidária numa viatura oficial do Governo Regional.

“Com milhões faço inaugurações. Com inaugurações ganho eleições.” Eis a máxima que, por estes dias, se atribui a JJ. Mais claro do que isto é impossível, que lhe seja dado o mérito de dizer abertamente o que outros tentam fazer dissimuladamente.

Cá para mim, bem feito era uma Baía dos Porcos à Portuguesa. As premissas estão lá todas: há uma ilha, há um ditador e há um povo des... hã... pois, afinal não é possível, falta a parte do povo descontente. Paciência, ficará tudo como está, assim como assim a outra baía também não resultou.

PS: Consta que Paulo Portas (PP) por estes dias usa todo o seu tempo livre a reler O Príncipe, o Mein Kampf e a ver embevecido as gravações de todas as aparições públicas de JJ. É preciso ter cuidado, tudo começa com um sonho. Basta imaginar o que seria uma aliança JJ-PP...

02 maio, 2007

Fumar/Não fumar

Entre o fumar e o não fumar (que por mim, já passou umas boas vezes), a legislação que aí vem restringe o fumo em alguns locais públicos, como os restaurantes com espaços inferiores a 100 m2. NPor ser tão evidente, nem sequer vale a pena adiantar mais sobre o assunto, além do que está escrito neste post de Fernanda Câncio
A não ser, claro, que sejamos o Miguel Sousa Tavares.

26 abril, 2007

Triunfo dos Porcos lava a cara

Alterar grafismos e formatos em orgãos de informação de referência é sempre uma decisão difícil. Temos por um lado a exigência dos nossos (3 ou 4) leitores, por outro, o peso da história.
De certo modo impulsionado pelos recentes restylings do Expresso e da Visão, também o Triunfo resolveu lavar a cara - liftings, peelings, botox, silicone, enfim, usou-se tudo o que cirurgia estética de hoje permite.
O resultado é este que se vos apresenta. Se o entenderem, deixem ficar os vossos comentários e sugestões.

PS: À semelhança do que acontece na administração da UnI, também o co-autor deste projecto não foi consultado sobre este novo grafismo. Existe por isso a possibilidade de uma qualquer providência cautelar obrigar a repor o antigo layout.

23 abril, 2007

Sem palhaços não há circo

Marcelo Rebelo de Sousa está contente, os Gatos estão contentes, o Inimigo Púlico está contente, o 24 Horas está contente, enfim, a alegria é generalizada. O circo está de volta à política (tudo bem que sempre lá esteve, mas ultimamente de fraquinha qualidade) e, obviamente, não há verdadeiro circo sem um bom palhaço - nesse papel Paulo Portas tem poucos (terá algum?) rivais à altura.

Ribeiro e Castro era um líder fraquinho, não tinha presença, era discreto, mantinha algum nível no discurso, coisas que obviamente não cativam ninguém. O que o povo quer é circo.
Apesar de Portas elevar sempre CDS em detrimento de PP, nunca como agora se intuiu tanto de PP as iniciais de Paulo Portas. Apareceu quando quis, disse e fez o que quis, não apresentou qualquer equipa e ganhou em (quase) toda a linha dentro do partido. O CDS-PP é definitivamente dele - nesse sentido literal de posse relativo a PORTAS e não de pertença relativa ao PARTIDO.

Quem dorme cada vez menos é Marques Mendes, tal como os Idos de Março traziam maus augúrios a Júlio César na antiga Roma, também a sussurante voz de Santana Lopes a que se junta o regresso de Portas, anunciam morte (política, entenda-se).
Esventre-se um cordeiro para que sobre as suas vísceras se perceba de que lado estão os deuses.

Marques Mendes esteve sempre numa 2ª linha de oposição - é mau, mas apesar de tudo não tem havido uma 1ª. A partir de agora ou espevita ou mirra. Parece no entanto que, até com o calor que já nos banha as costas, existem mais condições para mirrar do que que para florir.

Que os jogos comecem!

13 abril, 2007

Dossier Sócrates II

Não há outra forma de o dizer: o Público passou-se dos cornos.
Num artigo da edição de hoje, que pode ser visto aqui, o jornal faz uma análise às declarações do primeiro-ministro na entrevista da RTP, de quarta-feira. Esta análise não teria nada de especial, se não fossem alguns factos curiosos.
Todas as declarações analisadas são contraditórios que Sócrates levou para o écran, visando directamente o Público. Estas eram a sua resposta às insinuações do diário, que por sua vez são agora rebatidas em papel. Ou seja, vamos já no quarto grau de realidade, interpretações em cima de interpretações, que parecem não ter fim.
No post anterior, defendi que o caso ficaria encerrado depois da entrevista. Enganei-me redondamente, e apenas por ingenuidade. Tal como nunca pensei que Sócrates descesse ao ponto de passar quase uma hora, em directo, no programa mais visto desse dia, a explicar o seu percurso de aluno, também nunca pensei que o Público, depois disso (e este depois é já o segundo dia consecutivo a remexer na merda) se desse ao trabalho de rebater o que o primeiro-ministro tinha dito, quase palavra a palavra. Um bom exemplo é este trecho sobre a discussão à volta do número de cadeiras feitas e meses passados a estudar:

55 cadeiras para
se licenciar

"Eu fiz 55 cadeiras para me licenciar, fui analisado e avaliado por dezenas de professores e são eles que podem falar das minhas qualidades académicas e que estão aliás expressas nas notas"

Ao contrário do que disse, José Sócrates não completou "55 cadeiras para se licenciar" mas sim 43 cadeiras, contando todas as disciplinas do ISEC, ISEL e UnI. Para obter uma licenciatura, também não fez sete anos e meio de estudos superiores, mas sim seis anos lectivos.

Outro facto curioso é a forma como o o jornal trata o assunto. Para não cair numa lógica de tablóide, não pode tratar este assunto como uma notícia. Para não queimar o nome dos seus colunistas, não pode explorar o assunto como opinião. Como o director já está metido numa embrulhada da qual não consegue sair, não o pode fazer como editorial. O que resta? Uma análise, claro, esse género jornalístico entre o facto e a opinião, tantas vezes criticado pelos meios portugueses, que agora é assumido como normal. E quem assina? O Público, como entidade abstracta, e não ninguém em concreto como seria normal.
Mas sendo o Público o autor desse artigo, só deixo duas perguntas: como se sente Rosado Fernandes, o editor de economia do Público que na televisão disse que o assunto não merecia tanto tratamento e que agora se vê como co-autor daquele artigo?; e o artigo é assinado por Público para defender os jornalistas da casa ou para a Sonae (proprietária do Público) enviar um recado ao Governo a dizer que não esquece o assunto, como muita gente tem insinuado?

11 abril, 2007

Dossier Sócrates

Ontem, na SIC Notícias foi o cúmulo. Ricardo Costa (SIC) acicatava, José Manuel Fernandes (Publico) respondia, Sarsfield Cabral (Rádio Renascença) assentia, João Garcia (Expresso) ajudava. Todos estes jornalistas exigiram a cabeça de Sócrates e insinuaram, desde o início do programa, que o primeiro-ministro tinha sido favorecido pela Universidade Independente e vice-versa. Não interessa tentar perceber como é que este caso se arrastou desde há três semanas (duas, para quem não lê jornais). João Marcelino (ex-Correio da Manhã, actual director do DN) foi o único a ter os pés bem assentes na terra e a dizer que até ver, todas essas implicações entre Sócrates e a UI eram suposições e nada mais. Acrescentou ainda que, tal como eu e muita gente, nem sequer percebia porquê tamanho burburinho à volta do assunto. Sócrates lidou mal com o caso porque o devia ter enterrado logo no início. Mas o mais curioso é ver como os directores "de referência" depressa passaram para o tablóide em busca de algum assunto que levantasse a alma dos respectivos meios. E, do outro lado, como o director vindo do "tablóide", refreeiou os ânimos e não alinhou nesta feira. No meio da conversa de uma hora e meia, todos os directores de referência acharam que o assunto foi bem explorado, porque merecia ser explicado aos portugueses. Contudo, não foi isto que aconteceu. O que aconteceu foi estes meios terem trazido para a rua uma suposição e exigirem o julgamento popular do caso. Conforme chegou a dizer José Manuel Fernandes, exigia-se que as pessoas tivessem aos seus meios a possibilidade de se interrrogarem sobre este assunto. Convenhamos: deste interrogar até ao julgar, a diferença para as massas não é muita. E houve quem dissesse que nos jornais de referência norte-americanos (ainda hoje os baluartes de excelência) o assunto tinha sido e já o fora explorado da mesma forma. Isso é mentira. Nunca o New York Times ou o Washington Post mandavam para a rua a informação sem terem um verdedicto sobre o assunto. No caso Watergate, por exemplo, não se "supôs" nada; ao contrário, acusou-se directamente, e com provas. Para quem se queixa das tentativas de controle do Governo sobre os jornais (facto normal em qualquer democracia evoluída), deram um bom exemplo de profissionalismo. Será irónico que o dossier Sócrates acabe hoje, quando este der a entrevista à RTP. Será precisamente quando ele esclarecer tudo o que tem a esclarecer que os jornais de referência ficam sem nada para dizer.

05 abril, 2007

Quem vê TV ainda sofre mais que no WC?


Muito se tem discutido a questão do serviço público de televisão em Portugal. Se existe, se não existe, se há concorrência desleal com os canais privados, se os canais da RTP se constituem uma verdadeira alternativa, enfim, usam-se factos umas vezes, pressupostos outras, para se justificar uma posição que é necessariamente parcial quando se joga por qualquer das equipas (RTP ou SIC e TVI).
Não é fácil chegar a um conceito claro do que deverá ser o serviço público de televisão: é serviço público fazer programas de cariz cultural e intelectual para uma minoria de telespectadores, sobretudo quando este público-alvo tem, de um modo geral, um perfil sócio-económico que lhes permite aceder à cultura por outras vias? Enquadrar-se-á neste conceito um programa como o Preço Certo, que entretém centenas de milhares de pessoas todos os dias sem, contudo, acrescentar algo de minimamente relevante sob o ponto de vista educacional, de cidadania ou cultural?
Ao contrário do que se vem afirmando, na minha opinião é sobretudo o 1º canal da RTP que se tem constituído como verdadeira alternativa televisiva, sobretudo para quem não tem acesso às programações via cabo ou satélite. Este facto é particularmente relevante porque se trata de uma alternativa não de nicho, tarefa bem mais fácil, mas de massas.
Há anos que SIC e TVI abandonaram por completo o jornalismo de investigação, a informação aprofundada e complementar e o debate político. Neste momento só a RTP trilha esses caminhos - os programas do Marcelo Rebelo de Sousa e do António Vitorino, Prós e Contras, Grande Entrevista, Debate da Nação, o recente Portugal: um Retrato Social.
Depois de uma inicial e prolongada hegemonia da SIC ter dado lugar a uma hegemonia também prolongada da TVI, tem-se assistido nos últimos tempos a uma divisão tripartida de forma mais ou menos igualitária entre os 3 canais: de um modo geral a liderança tem pertencido à TVI, contudo sem grande distanciamento relativamente à concorrência. Acresce que o Canal 1 da RTP chegou já ao 2º lugar, ultrapassando a SIC (Março de 2006: 1º TVI 28%; 2º RTP1 27.6%; 3º SIC 25.8%).
Não obstante o peso do futebol na programação, de que tanto se queixam os operadores privados e com os quais concordo neste aspecto, há um sinal claro de que as horas intermináveis de programação dedicadas a telenovelas e reality shows terão que ser reajustadas – a estratégia do mesmo que se sucede ao mesmo que já havia de mais, estarará a ficar saturada. Felizmente.

27 março, 2007

The stairway to...

AHCOT

Importa-se de repetir?

“Novo gestor da REN saiu da Galp há um ano com indemnização de meio milhão”

Este é o título da notícia do dia que veio hoje a público no Público, sendo depois reproduzida por diversos orgãos de comunicação.
Com umas “gordas” intencionalmente apelativas como estas quem é que se dá ao trabalho de ler a notícia? Ninguém.
Não tenho que fazer aqui qualquer defesa, muito menos de alguém com os bolsos bem mais endinheirados do que os meus, mas faz-me muita confusão a vontade que existe em encontrar casos chocantes de insulto e ultraje ao pobre povo Português. A vontade é tanta que nem se tenta perceber o que realmente aconteceu. Passo a citar:
“Rui Cartaxo é quadro do Banco de Portugal, de onde transitou para a administração da Transgás, então acabada de fundar por Elias da Costa, e onde permaneceu depois da sua integração na Galpenergia, sempre por nomeação do Estado. Com a chegada de Américo Amorim à Galpenergia e a redução da posição do Estado, renunciou ao cargo por decisão dos novos accionistas privados para dar lugar a Ferreira de Oliveira, o antigo presidente da petrolífera que assim regressava à administração da empresa por nomeação do novo accionista privado e da qual é hoje presidente executivo.”
O que aconteceu é que alguém nomeado pelo estado é (naturalmente) convidado a sair pelos accionistas privados a partir do momento em que se tornam maioritários. Também me parece claro que os accionistas privados saberiam muito bem dos valores envolvidos no decorrer deste processo.
Mas, percebo, sem oposição tem que ser a comunicação social a fazer algum barulho.