29 dezembro, 2005

Corps Bride (continuação)

A história certa que Tim Burton queria filmar teria que deixar espaço suficiente para integrar a técnica do stop-motion, difundida da melhor forma por Wallace/Cooper no original "King Kong". Ao mesmo tempo, teria que integrar elementos de homenagem ao terror.
Além da atmosfera pálida que domina praticamanente todo o filme (parabéns à fotografia), e os acessórios (caixões, a mansão enorme mas vazia) a remeter logo para a lugrubidade , Burton pegou nas vozes. Não as dos personagens principais, mas as dos secundários. Bela Lugosi, Vincent Price, Martin Landau, e outras estrelas do terror da Universal Pictures tinham em comum uma coisa: a própria voz já era assustadora. Em "Corps Bride", a tradição é seguida.
Burton teve um cuidado fenomenal em escolher as vozes para os personagens secundários e muita da gulodice do filme está aí: do lado de Victoria, Albert Finney genial como Finnis Everglot, Joanna Lumley como Maudeline Everglot; do lado de Victor, Tracey Ullman irreconhecível como Nell Van Dort e a criada Hildegarde e Paul Whitehouse como William Van Dort e o criado Paul the Head. Há ainda o grande Christopher Lee como o Pastor Gaslwells, e Richard E. Grant como o carroçeiro Barkis Bittern. Pena é a voz da lagarta que vive no interior da cabeça da noiva, a sua consciência, imitar a voz de Gollum, do Senhor dos Anéis.

Corps Bride














Será este o filme que Tim Burton sempre quis fazer? Prefiro o Nightmare Before Christmas, mas este pertence com mais facilidade ao universo do realizador do que o outro das aventuras de Jack Skellington.
Corps Bride parece uma imitação de "Nightmare Before Christmas". O tema musical deste filme é uma cópia fiel e sem nada escondido de "Jack's Lament", a melhor música do filme de 93; a fisionomia de Jack e Victor é praticamente a mesma, com a particularidade da face de Victor ser inspirada na personagem que Johnny Depp interpreta em Charlie and the Chocolat Factory; a animação dos bonecos, entenda-se, tiques de movimento, como a forma de cair no chão e de andar são os mesmos de "Nightmare..."; e o argumento e mise-en-scéne está também dividido em dois espaços - o mundo dos vivos e o mundo dos mortos, como no outro era a véspera de Natal e o Dia das Bruxas. Além destes aspectos, há ainda o descarado cão-esqueleto que em "Nightmare..." era um cão-fantasma ou as cenas em que se separa o braço do corpo da noiva, tal como acontece na Sally em "Nightmare..."
No entanto, há particularidades neste filme que remetem para o início de carreira de Tim Burton, especialmente nas homenagens aos filmes de terror (série B) que passavam a altas horas na televisão. "Frankenweenie" (84) é um bom exemplo, mas "Vincent" (82), que é uma homenagem ao actor Vincent Price, narrada (ou contada) pelo próprio, e inspirada no poema de Edgar Allan Poe, "The Raven", é do melhor de Tim Burton. Só por exemplo, já lá estão os jogos com as sombras que se tornam monstros que se podem encontrar em diversos filmes de Burton. Ambas as curtas-metragens estão no DVD de "Nightmare Before Christmas".
Bem, "Crops Bride" é a longa-metragem do que Tim Burton não fez em "Vincent". Burton escreveu um artigo no "The Guardian" onde explicava que partiu de uma técnica (stop-motion por fotografia, e não em câmara de filmar) para encontrar uma história. Já o queria fazer desde "Nightmare...", mas ainda não tinha encontrado a história certa. (continua)

21 dezembro, 2005

Greve nos transportes em NY

Sem esquecer que Nova Iorque não é Lisboa, ao ler as reportagens sobre a greve dos transportes que afectou sete milhões de utilizadores, pensei logo como seria por cá.
Em NY, houve logo um plano de contingência, que limitou a entrada de automóveis que não tivessem no mínimo quatro ocupantes, alterou o início das aulas em duas horas mais tarde, e promoveu percursos alternativos para os vários meios de transportes (os mais habituais foram o pé e as bicicletas, mas houve quem quisesse entrar de cavalo). Os nova-iorquinos levaram tudo isto na brincadeira, conforme se pode ver nas reportagens dos jornais de lá, e sem grandes ondas. Mas tudo tem um limite, e o mayor pretende indemnizações da parte dos sindicatos para fazer frente aos milhões de dólares perdidos por cada dia de greve.
Em Lisboa, nada disto acontecia. Uma greve nos transportes públicos não se faria notar, porque nós não temos transportes públicos. Aquilo por que os nova-iorquinos estão a passar agora - a falta de meios e alguma impotência para resolver os seus problemas de transporte - é o que o utilizador da Carris ou do Metro passa todos os dias.

20 dezembro, 2005

Que bibelot combina melhor com o seu naperon?

Sempre tive alguma dificuldade em perceber as monarquias deste nosso tempo. Monarquias constitucionais e democráticas como resolveram chamar-lhe, se bem que me parece que a designação é em si paradoxal. O que me faz confusão é simples: para que raio existe um rei e uma família real, uma vez que não governam?
Espanha, Inglaterra, Suécia, Dinamarca ou Noruega, são exemplos de países desenvolvidos, onde existem reis e rainhas, princesas e príncipes, que fazem as delícias dos media cor-de-rosa e de outras cores, parecendo existir apenas como elementos decorativos que mantêm vivos os seculares contos de fadas.
Isto era o que eu pensava antes do início desta pré-campanha presidencial. Neste momento, deixei de achar.
No início desta pré-campanha fiquei espantadíssimo com os poderes do nosso PR. Os candidatos apresentaram manifestos mais completos do que um programa de governo. Ele era o emprego, o crescimento económico, o desenvolvimento tecnológico, a cooperação estratégica umas vezes, o pensamento estratégico outras, etc, etc…
Era caso para dizer que com presidentes destes, quem precisa de primeiros-ministros. A verdade é que fiquei entusiasmadíssimo com a salvação do país que chegava à nossa porta.
Contudo, rapidamente começamos a perceber que tudo o que referiam os candidatos era mentira. Os manifestos, os discursos, tudo. Afinal o PR não tem poderes para nada e os candidatos de repente deixaram de poder emitir opinião sobre milhares de assuntos, uma vez que essas não são as suas competências mas sim as competências do governo – excepção para Louçã e Jerónimo onde a embrulhada é sempre a mesma. Ainda fiz umas perguntas para tentar perceber se alguma coisa tinha mudado sem que eu me tivesse apercebido, mas não, não mudou nada, sobretudo a hipocrisia.
Em suma, de um momento para o outro começamos a ouvir que os super-poderes dos super-candidatos são afinal um: zelar pelo bom funcionamento das instituições. Sem perceber muito bem o que significa, admito que deverá ser algo de muito complicado, uma vez que nenhum dos candidatos o foi capaz de explicar com clareza.
Como não conseguem explicar, cada um interpreta à sua maneira. A minha é esta: cabe ao PR zelar pelo bom funcionamento das instituições, ou seja, fazer nenhum. Assim já se percebe a grande dificuldade que todos manifestam em conseguir explicar qual é o papel do PR.
Ora, isto leva-nos ao início desta reflexão, porque se é para fazer nenhum mais vale um rei à maneira, que sempre nos podia lembrar que nos momentos em que Portugal foi grande, era um rei que estava ao leme.
Tudo bem que temos uma vantagem, relativamente às monarquias instituídas, que é a capacidade de elegermos o nosso próprio bibelot. Contudo, fazendo a retrospectiva, acho que os Portugueses não têm tido muito bom gosto. Pensasse eu há uns meses o que penso hoje e seria o primeiro a gritar “Santana à presidência!” Mas confesso, nunca tinha visto as coisas nesta perspectiva.

PS: Se repararem bem, D. Duarte, Duque de Bragança e legítimo herdeiro do trono Luso, até tem grandes semelhanças com o mais que provável futuro Presidente da República, Professor Cavaco Silva - para além da semelhança física, a dificuldade de expressão, a cultura geral limitada e a mesma voz rouca de quem gosta de bolo rei. Por aí acho que nem notaríamos a diferença.

19 dezembro, 2005

Debate político em Portugal, século XXI

Dos oito “debates” realizados até ao momento, prostrei-me diante do televisor em cinco ocasiões, vi dois do princípio ao fim e adormeci, total ou parcialmente, em três. As noites vão frias e o lar, aconchegado pelas fontes artificiais de calor, a isso convida.
Os restantes não os vi, deliberadamente. Tal como não vou ver os dois que ainda faltam, hoje e amanhã, deliberadamente.
Um pouco por acaso acabei por descobrir por que é que todas as expectativas criadas acabaram por se traduzir num longo e saboroso bocejo, que nada impediu de se transformar numa reconfortante soneca. A explicação está aqui, no acordo a que chegaram as televisões RTP, SIC e TVI e as candidaturas de Alegre, Cavaco, Jerónimo, Louçã e Soares. O tamanho da explicação são 27 exaustivos e enfadonhos pontos, onde apenas faltou referir que o Mário Soares não podia tossir, cuspir ou escarrar mais do que 4 vezes por programa, que ao Manuel Alegre só era permitido não saber a resposta a 5 perguntas, que Jerónimo de Sousa e Francisco Louçã tinham que assinalar no mínimo 2 diferenças entre o discurso apresentado nestas eleições presidenciais e os discursos apresentados para as legislativas e autárquicas e que, por fim, Cavaco Silva seria obrigado de 10 em 10 minutos a dizer alguma coisa.
Provavelmente acabou-se o papel.
Este tratado de não agressão assinado pelos candidatos podia resumir-se em duas pérolas. A primeira é o ponto nº 10:
“10. Em cada debate intervêm 2 jornalistas e a eles é dada a condução das duplas entrevistas;”
Esta referência a debate como dupla entrevista é algo que me deixa fascinado.
A segunda é o ponto nº 12:
“12. Os candidatos são colocados de frente para os jornalistas e a uma distância razoável entre eles e em mesas autónomas;”
Tudo isto é depois enfaticamente anunciado pelas televisões como “o debate que coloca frente-a-frente os candidatos x e y.”
A este respeito gostava de deixar aqui uma mensagem:
E se os senhores candidatos e senhores jornalistas fossem atirar areia para os olhos da puta que vos pariu?
É apenas uma pergunta em jeito de sugestão.
Tanto os jornalistas como Cavaco Silva (a associação surgiu-me espontaneamente), fartaram-se de referir que este é o modelo de debate que vigora em todo o mundo ocidental, não percebendo porque é que não deveria ser aplicado em Portugal.
Pois bem, Senhores jornalistas e Ex.mo Professor Cavaco, eu posso explicar. De nada vale importar os modelos sem importar os políticos. Seria como importar foguetões espaciais e depois colocar aos comandos os pilotos TAP, provavelmente nem chegariam a levantar.
Neste momento não tenho dúvidas de que no lugar de se realizarem 10 entrevistas duplas, teria sido mais vantajoso realizar apenas uma entrevista quíntupla. A soneca seria só uma é certo, mas bem mais prolongada.

PS: Razão tinha esse visionário chamado Luís Delgado que não se cansou de repetir, antes ainda das entrevistas começarem, que estas coisas em nada influenciam o eleitorado (sobretudo aquele que adormece durante os lado-a-lado). Ouvidos lhe fossem dados e não andávamos por aqui a perder tempo.

O que é isto?

"Jerónimo invoca S. Jerónimo

O candidato presidencial Jerónimo de Sousa pediu ontem, em Chaves, que se lembrem de "São Jerónimo" no dia 22 de Janeiro e "não apenas quando troveja ou as dificuldades aumentam". Prosseguindo neste apelo, Jerónimo de Sousa recordou um agricultor que lhe disse durante uma visita à região que "quando troveja se lembram sempre do São Jerónimo, mas depois nas eleições a mão escorre sempre para a direita"."

in DN (19/12/05)

14 dezembro, 2005

Cavaquistianismo

Neste blog, o candidato Mário Soares tem sido mais referido que Cavaco Silva. Não há nenhuma razão especial para que isso aconteça, a não ser o facto de Soares ser efectivamente mais patético que Cavaco.
Contudo, Cavaco tem vindo a ganhar pontos nesta corrida de ridicularização. As declarações finais que tem feito ao fim dos debates e entrevistas da SIC são um bom exemplo de como poderá chegar perto de Mário Soares.
Sabendo que o seu principal defeito é a falta de coloquialidade, Cavaco tenta aparentar um ar mais descontraído no final de cada entrevista ou debate da SIC, enquanto o jornalista o vai acompanhando até à saída do estúdio e fazendo umas perguntas para quebrar o gelo. Mas antes disso, e depois do choque traumatizante que foi a interpelação com outras pessoas em directo, Cavaco tenta desafogar a tensão. Como quem diz: "Ufa, desta já me livrei". Para cereja em cima do bolo, só faltava a imagem a limpar o suor da testa com a manga do casaco - imagem de trabalhador que cumpriu o frete. E não é que, no final do debate de 13 do 12, depois de estar em directo para as câmaras, ele limpou o suor e suspirou mesmo? E o jornalista comentou o facto?
A imagem de homem rígido que Cavaco inspira é falsa. Serve para o mostrar como tecnocrata e funcionário envolto em pilhas de papéis sempre pronto a dar tudo pelo Estado. No fundo, é uma imagem anti-desleixo, do contabilista com mangas arregaçadas. No estado em que as pessoas são levadas a pensar que o país se encontra, é natural que apareça como o santo que pode meter as contas em ordem.

12 dezembro, 2005

Campanha de leitores

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05 dezembro, 2005

O defensor da liberdade

PÚBLICO - Em democracia a alternância é um valor em si mesmo. Contudo tem-se referido à Presidência da República como se fosse algo que em Portugal pertence por direito à esquerda.
MÁRIO SOARES - Evidentemente que pode haver Presidentes de direita se for essa a vontade popular. Agora a verdade é que nas eleições presidenciais a esquerda teve sempre maioria. É um facto e não percebo porque é que agora devia haver uma alteração.

(...) É estranho que Cavaco Silva seja tão injusto em relação a um governo no qual o seu partido participou. Isso é um hábito que ele tem, que não me parece saudável, de criticar o seu próprio partido. (...)

Coloca a hipótese de as eleições não serem limpas?
Tem havido alguma pressão da comunicação social favorável a um candidato. Não quero ofender, mas se o meu amigo ler com atenção os jornais, como eu leio, e conhecendo os truques que aí fazem, não restam dúvidas. E então na televisão ainda é mais claro.

Mário Soares




Legendas:

1. "Soares nem parece ele! - disse um habitante da região"
2. "Mais velho dos candidatos visita planalto transmontano e agasalha-se para o frio"
3. "Populares aplaudem solução tecnológica que minimiza riscos ambientais"
4. "Ex-presidente troca Joana Amaral Dias por "minina" de Bragança" (1ª à esq.)
5. "Essa lã é de ovelha?, inquiriu jornalista da TVI"