12 outubro, 2005

Alice, Alice

“Alice” tem sido apontado como o filme português mais promissor dos últimos anos. É preciso desfazer equívocos como este. Não que “Alice” seja um mau filme, mas porque está a ser sobrevalorizado. Trouxe o prémio para jovem realizador de Cannes e deixou a crítica portuguesa rendida aos seus pés. Para quem não está habituado a ler sobre cinema, o feito de Marco Martins parece ser grande. Mas para quem sabe que os críticos portugueses se põem de joelhos ao primeiro filme soturno que lhes apareça, não é surpresa.
O argumento de “Alice” resume-se a isto: um homem procura a filha desaparecida. Claro, a crítica tratou logo de extrapolar esta história dizendo que se tratava “de filmar literalmente a obsessão” (Ed. Prado Coelho), a “ausência” (Katleen Gomes), utilizando essa “persistência tenaz do pai” como um “miolo dramático”, “limpo de palha sentimental” (Eurico de Barros). E acrescentou ainda que Lisboa nunca tinha sido filmada assim. Basta recordar os filmes de Cláudia Tomaz e “Daqui p’rá Alegria”, de Jeanne Waltz para ver que “Alice” no traz nada de novo na forma como se filma Lisboa. É bom de referir que está para chegar o cineasta que mostre tão bem a capital portuguesa como fez António-Pedro Vasconcelos (em “O Lugar do Morto”) ou Fernando Lopes (com “Belarmino”).
Houve quem dissesse que desde “Ossos”, de Pedro Costa, não se via nada assim. É verdade. Desde “Ossos” que não se via um embuste assim. Passados dez anos, prova-se que as coisas continuam na mesma, até no cinema. E, enquanto a corja de críticos que domina o cinema não for demitida, tudo será igual.

2 comentários:

Tiago Franco disse...

Já que se fala na forma de filmar lisboa, não podemos esquecer "A Janela" de Edgar Pêra e "Lisbon Story" de Wim Wenders".

No segundo temos a forma de como Lisboa é vivida por alguém que vem de fora, no primeiro um retrato fiel da Lisboa bairrista com cheiro a sardinha e a urina nos vãos de escada.

beterraba disse...

Premonitoriamente, já há muito tempo que Manuel João Vieira (Ena Pá 2000) sabia o que fazer com a Alice...