03 novembro, 2005

Político profissional não quer a reforma

Quem assistiu ontem à noite à entrevista de Mário Soares na TVI, percebeu, pelo menos eu percebi, que o homem vale bem mais do que os 10% que as sondagens lhe atribuem. Ficou claro que Mário Soares só tem a ganhar com este tipo de exposição, seja ela entrevista ou debate. Se Cavaco Silva se diz político não profissional, Mário Soares nem de pantufas a dormir a sesta no sofá deve conseguir ser outra coisa.
Mário Soares revelou-se ao seu melhor nível quando falou do perfil que Cavaco não tem para ser Presidente da República. Quando disse, com razão, que a Cavaco não se lhe conhece pensamento ou posição sobre outro assunto que não seja economia ou finanças. Que pensa Cavaco da crise que a Europa atravessa, da crise que Portugal atravessa, de Bush, do Iraque, da relação de Portugal com África e com os PALOP em concreto?
Gostei particularmente do argumento de que Cavaco se resguarda o mais possível para não avivar a memória, a má memória, que os Portugueses têm dele. É bem capaz de ser verdade.
Gostei da clareza e frontalidade com que deitou por terra o fantoche das eleições presidenciais apartidárias.
Contudo, Mário Soares também teve momentos maus. Esteve mal quando falou de Alegre – “ele é que devia ter a iniciativa de vir ter comigo porque eu sou mais velho”; do apoio do PS - “o PS é que me procurou para dizer: precisamos de si”. Esteve mal quando quis passar a mensagem de que também percebia de “números”, relatando, mas não de cabeça, os valores do défice no tempo da maioria laranja. Continuou por baixo ao atribuir a responsabilidade da crise que o país atravessa aos “2 anos do governo do PSD”, leia-se Governo de Durão Barroso.
Resumindo, Mário Soares esteve bem, mas não esteve imaculado.
A minha opinião é a de que terá tudo a ganhar na exploração da comparação directa de personalidades, conhecimentos e experiências de ambos. Acredito também que, para já à esquerda, rapidamente a tendência das sondagens se vai alterar a seu favor.
Cavaco foge dos jornalistas, prepara metodicamente discursos dos quais não se afasta um milímetro. Mário Soares fica triste quando a entrevista acaba - “Já! Agora que a conversa estava tão agradável!”. Soares estava com muitas saudades, percebe-se pelo olhar feliz e ar jovial que apresenta no fim da entrevista. Fica também claro que Soares se candidata não por causa do país, não por causa do partido, mas por ele próprio.
Num outro momento de elevado nível político, Soares conta mais um episódio: a propósito de uma cimeira, não afirmo com total certeza, ibero-americana, a dado momento tornou-se necessário defender a posição de Portugal sobre determinado assunto. Mário Soares terá interpelado Cavaco Silva para que na qualidade de 1º ministro do país o fizesse. Este terá dito: “fale lá você que tem mais jeito”.
Não tenho a certeza de que Mário Soares tenha mais jeito, mas que ainda tem muito, lá isso tem.

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